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FAZ – Ideias de Origem Portuguesa abre esta segunda-feira a sua segunda edição.Uma proposta da Gulbenkian para portugueses que estão lá fora e cá dentro.

Entre plantas e esboços de edifícios, José Paixão passava os dias em Viena, Áustria, debruçado sobre uma pós-graduação na área da arquitectura. Ricardo Reis da Silva escolhera Amesterdão, Holanda, para se doutorar em Matemática Aplicada. Cada um tinha uma ideia de um projecto que gostava de colocar em prática quando ouviram falar no concurso FAZ – Ideias de Origem Portuguesa.

José Paixão e Ricardo Reis da Silva não se conheciam e candidataram-se com outros amigos, a viverem em Portugal, ao concurso e estavam longe de imaginar que este seria o seu passaporte de regresso a Portugal.

A segunda edição da iniciativa da Fundação Calouste Gulbenkian e da Fundação Talento – de que o PÚBLICO é parceiro – arranca esta segunda-feira e, tal como aconteceu com os dois candidatos, o objectivo é reaproximar de Portugal os portugueses espalhados pelo mundo.

“Como estava há mais de dez anos fora, sentia-me um pouco desligado do país”, conta José Paixão que, com apenas 15 anos, abandonou Portugal pela primeira vez para estudar num liceu nos Estados Unidos. Aprendeu a controlar as saudades e, seguidamente, apostou numa licenciatura em Arquitectura no Reino Unido e em trabalhos em Londres e Amesterdão. “Vi no FAZ uma oportunidade para dar um contributo a Portugal na fase atribulada que o país atravessa”, explica.

A esse contributo chamou-lhe "Arrebita!Porto", o projecto de reabilitação urbana a custo zero com que acabou por vencer o concurso. Os mais de dois mil quilómetros de distância não impediram que conseguisse identificar um problema da sua cidade natal: a degradação dos edifícios abandonados. Depois de propôr uma solução inovadora com base numa rede de trocas e contrapartidas entre proprietários carenciados, estudantes internacionais de arquitectura e engenharia e empresas e universidades, deixou para trás as temperaturas negativas e precipitou-se num regresso feliz a Portugal.

“Vim de propósito e valeu a pena”, reflecte o arquitecto, que lidera uma equipa de nove pessoas, quatro engenheiros e cinco arquitectos. “Tem sido uma experiência com a qual tenho aprendido muito, tanto a pôr em prática um projecto idealizado como a contribuir de forma útil para a sociedade”, diz José para quem a pró-actividade sai beneficiada quando se trabalha no próprio país.

O "Arrebita!Porto" abriu portas não só a José e à sua equipa, mas também aos cerca de 20 estudantes Erasmus que já participaram no projecto e que vieram de países como a Noruega ou o México para, durante três meses, trabalharem em Portugal. “Alguns deles quiseram continuar envolvidos no projecto, o que foi muito gratificante. Houve até sinergias que resultaram em oportunidades de emprego nas empresas associadas”, conta o arquitecto.

O prémio de 50 mil euros ganho no concurso tem sido aplicado na reabilitação piloto de um edifício situado na zona histórica do Porto onde começaram a trabalhar em Abril do ano passado e que, neste momento, se encontra em fase de início de obra. O objectivo é, em Fevereiro de 2014, quando a obra estiver terminada, arrendá-lo a preços mais baixos do que os praticados no mercado. Por enquanto, o Porto, depois o mundo.

Planear viagens
Ricardo Reis da Silva não trouxe do FAZ nenhum valor monetário, mas, com a ideia em que aliava a tecnologia a uma preocupação ambiental e ainda prestava um serviço útil à sociedade, conquistou um lugar nos dez finalistas e conseguiu a visibilidade fundamental que um projecto requer numa fase de arranque. Idealizou o com o projecto TECO Planner, um site em que se podem planear viagens em transportes públicos, e também ele apanhou uma boleia criativa da Holanda para Portugal.

“Estava em Amesterdão a tirar o doutoramento em Matemática Aplicada e o facto de ter chegado aos dez finalistas deu-me motivação para regressar”, recorda. Regressou. Juntou-se à equipa de três elementos e uniram esforços para suprir uma necessidade do dia-a-dia, sempre com uma preocupação ambiental em mente. “Não há um único sítio onde as pessoas possam planear uma viagem de transportes públicos”, esclarece. “E se o primeiro passo é difícil, a tendência é recorrer aos automóveis”, acrescenta.

Estabeleceram parcerias com empresas de sistemas de informação e operadoras de transporte e no, início deste ano, o projecto TECO Planner materializou-se num site onde os utilizadores já podem seleccionar num mapa os pontos de partida e de regresso e calcular o tempo e as várias alternativas da sua viagem em transportes públicos. Por enquanto, os dados recolhidos restringem-se ao concelho da Maia, no Porto, mas o objectivo é alargá-los a outras cidades do país.

De momento, este projecto é a prioridade de Ricardo Reis da SIlva, que não pondera voltar a sair de Portugal. “Gosto de estar cá e as pessoas terem ficado entusiasmadas com o projecto foi uma boa motivação. Se tudo correr bem, mais rapidamente me imagino a continuar cá do que a sair”, afirma.

Nova edição com algumas diferenças
A segunda edição do concurso FAZ arranca esta segunda-feira e à Fundação Calouste Gulbenkian junta-se a COTEC que se serve da parceria para entregar, pela sexta vez, o Prémio Empreendedorismo Inovador da Diáspora Portuguesa. Tal como no passado, as equipas a concurso devem integrar um português ou luso-descendente residente no estrangeiro, para “tornar o país mais visível para os emigrantes portugueses que têm uma relação com Portugal que, mais do que afectiva, pode ser operacional”, diz Luísa Valle, directora do programa Gulbenkian Desenvolvimento Humano, que criou o concurso.

As ideias podem ser submetidas numa das quatro áreas: Ambiente e Sustentabilidade, Diálogo Intercultural, Envelhecimento e Inclusão Social.

Embora o objectivo principal seja o mesmo, na segunda edição, o prémio (50 mil euros) não será atribuído apenas a um vencedor, mas premiará as três melhores ideias. A formação dada aos candidatos apurados após a primeira fase de selecção será também reformulada para que a aplicação prática da ideia seja o mais bem-sucedida possível.

No ano passado, concorreram ao FAZ 203 ideias provenientes de 58 países. Este ano, José Paixão e Ricardo Reis da Silva deixam algumas recomendações aos novos candidatos: “definir um problema específico e não ter ambição de responder a todos os problemas e ter uma relação emotiva com o projecto para alimentar o esforço ”, aconselha o coordenador da equipa Arrebita!Porto e “estar preparado psicologicamente para enfrentar desafios e ultrapassar obstáculos”, sugere Ricardo Reis da Silva.

O FAZ nasceu de uma necessidade de olhar para os talentos portugueses no estrangeiro de uma forma positiva, pois – na opinião de Luísa Valle – são, geralmente, sinónimo de novos olhares e atitudes. Talvez com segunda edição alguns deles regressem também a Portugal.

in Público